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OS QUATRO ERRES DA APRENDIZAGEM



     
No mundo globalizado em que vivemos, não se discute a necessidade de  aprender uma segunda ou terceira língua, mas, sim, como, quando e em quanto tempo. 
Partimos do princípio que todos podem adquirir tal habilidade,  segundo a condição e o empenho de cada um. Condição sócio-econômica e cultural, quem tem mais conhecimento aprende mais facilmente e melhor. Em seguida, o empenho, o fator que vai de par com a curva da aprendizagem. E, last but not least, o auxílio de uma pedagogia clara, ágil e estimulante para alavancar os cérebros de todas as idades. 
 Ainda que a aprendizagem de uma língua estrangeira seja uma atividade prazerosa e até mesmo um jogo e uma brincadeira, ela representa um desafio de grande impacto na vida dos aprendizes e muitas vezes o sucesso e a frustração se separam por um fio. Chegamos então ao professor, aquele que lida com o passo a passo do processo, prepara os conteúdos e determina a estratégia, o método.
Crianças ouvem, repetem, mostram, pulam, desenham, colorem, escrevem na carteira; seguem fielmente as orientações do professor, imitam seus gestos, sua voz, sua pronúncia.  Pré-adolescentes são dispersos e espertos, vão e voltam, adoram por o mestre à prova. Ados são instáveis, prefeririam sair com os amigos a estar ali, faltam às aulas "quando preciso", mas são, geralmente, excelentes alunos. Adultos se dividem em um grande número de perfis, que cabe ao professor compreender para tirar deles o melhor proveito.  

Empenhar-se significa desenvolver uma estratégia pessoal de aprendizagem,  a qual tem como objetivo tornar o aluno independente (do professor) o quanto antes possível. 
Após estes breves entreveros, enumero a seguir algumas reflexões sobre a aprendizagem de idiomas, de um ponto vista prático e direto, para uso de leigos e baianos.
A aprendizagem (não apenas de línguas estrangeiras) está relacionada a quatro fatores, que chamarei, por simples convenção, de “os quatro Rs da aprendizagem”. Quais são esses quatro fatores?
São: Recursos, Repetição, Regularidade e Relaxamento.
Uma denominação arbitrária. Poderiam ser os fatores do M ou do J, mas eu gosto da letra R, pois ela é particularmente marcante nos sotaques e na pronúncia de cada idioma.
É importante ressaltar que todos, com exceção dos portadores de problemas mais graves, possuem os recursos de primeira ordem e em igual proporção: os de natureza mental. A inteligência, no sentido lato. Mas essa ferramenta existe em estado potencial, precisa ser desenvolvida e, para tanto, precisa receber estímulos.
Embora pareça óbvio, nem sempre nos atentamos à realidade que constitui os imensos recursos mentais de que dispomos. Preferimos dizer que “fulano é inteligente” ou que “cicrano tem facilidade para o inglês”, ao invés de enfrentar nossa própria acomodação. 
As qualidades que diferenciam os alunos não estão relacionadas a um grau maior ou menor de inteligência ou de “facilidade”, mas sim a fatores como vontade, perseverança e disciplina. 
Os recursos de natureza material podem representar limitações fundamentais, mais ainda assim não constituem um impedimento. Com um simples acesso à internet, por exemplo, a pessoa pode ir longe, desde que saiba como usá-la. Tudo deve ser aos poucos, do simples ao complexo, não adianta tentar um passo maior do que a perna.
Aprender é, essencialmente, repetir - desculpem a platitude, é parte do meu ofício. Ler, ouvir e fazer mais de uma vez para se aprender de fato. Repetindo  aprendem as crianças, que adoram ouvir a mesma história mais de uma vez, muitas vezes até a memorização. Treinar e aperfeiçoar, outro exemplo que observamos  nas crianças. 
Muita gente tem preguiça de fazer exercícios e depois se desculpa por não “ter facilidade”. Preferem enganar a si mesmas a encarar sua falta de bons hábitos de estudo.
O número de repetições necessárias varia de acordo com o individuo, e isso  determina diferenças entre o tempo de aprendizagem de cada um. Quem precisa de mais repetições, precisa de mais tempo ou de maior intensidade. Escrever, ouvir, ler, colocar o livro debaixo do travesseiro (para aprender dormindo), escolha dentre os exercícios disponíveis aqueles que lhe são mais agradáveis  e produtivos.
À repetição associamos o ato de recordar ou trazer à lembrança. Aprender é recordar, trazer à memória os conteúdos assimilados, de modo a tê-los à disposição e prontos para uso. A mente precisa ser estimulada contínua e regularmente. É assim que evitamos aquela deficiência da  qual todos se queixam: o esquecimento.
Não se deve, contudo, repetir a esmo, sem uma determinada regularidade. É esta que permite a conexão natural com o conteúdo estudado anteriormente, estabelecendo desse modo a sequência.  Se começamos e paramos, perdemos energia; se mantemos um ritmo, ainda que lento, garantimos o progresso. Não conheço exceção a esta regra.
A aprendizagem acontece no tempo e cada um possui seu tempo pessoal, seu ritmo, que precisa ser descoberto, conforme colocado acima. Pode parecer difícil inicialmente, pois somos condicionados a agir mecanicamente dentro do mainstream, no trabalho,  no lazer e no estudo. 
O relaxamento é o que poderíamos chamar de lúdico ou prazer, mas nem lúdico nem prazer começa com R! Designa a quebra da tensão física e mental, em vista de recuperar a energia desprendida. Ao interromper a série repetitiva e reprocessar a rotina que a repetição e a regularidade podem criar, inserimos novas possibilidades ao jogo.
Comecei a estudar línguas estrangeiras quando entrei para a universidade, o que é tarde para os padrões de hoje. E não tinha  nenhuma “facilidade”. Adquirir um primeiro idioma estrangeiro através de uso fluente, no caso, o francês, foi muito difícil, pois havia um abismo entre minha realidade e a sofisticação dessa língua de literatos e pensadores. Ao partir para mais um idioma, o inglês, senti menos dificuldade, pois já tinha passado por várias adaptações e era mais flexível. E quando decidi incorporar um terceiro idioma, o espanhol, beneficiei-me de toda a experiência adquirida anteriormente. 
Havia experiência, mas havia sobretudo método, eu conhecia bem minhas características e era um aprendiz independente. 
Com esse perfil autodidata (só o francês aprendi em um curso regular), acabei por fazer uma escolha profissional definitiva: ao invés de professor de história, minha formação acadêmica, tornei-me professor de línguas estrangeiras e tradutor. 
Enfim, algo que considero sumamente relevante para quem queira usar seus recursos mentais e se manter jovem e feliz: ter postura de aprendiz. Cultive aquela curiosidade nata de sua infância, aceite novos desafios, permita-se rir diante dos percalços e não dê demasiada importância aos erros, eles são meios. 
Em pouco tempo, e sem sentir o peso, você poderá brindar-se com as conquistas que tem como ideal!

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Abrão Brito Lacerda

16 03 18

29 07 19

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